Tela do artista plástico moçambicano Antero Machado.

Tela do artista plástico moçambicano Antero Machado.

quarta-feira, 19 de maio de 2010

Meu nome é Johnny

 Chegando hoje em casa, rua de muito movimento que nos obriga a estar sempre atentos, pelo canto dos olhos vejo um vulto preto saltando o muro da frente em direção a garagem da casa vizinha. Casa comercial, com uma boutique de alta costura e um coiffeur. Vários carros estacionados a frente e observei uma criatura se escondendo sob eles. Parei o carro, mal estacionado, meio fila dupla e fui pegar aquela figurinha que havia fugido. Esgueirou-se por entre as grades e sumiu. Carros buzinando, volto meio envergonhado e sigo em direção a minha garagem. Preocupado volto a rua para procurá-lo, havia desaparecido.  Johnny, esse é o seu nome. É um gato angorá que ha 11 meses, minha filha adotou, recém nascido. Em casa já havia outra gata, a Mina, uma viralata linda, de três cores, bonachona, enorme, pesa 6 kg, já com seus 3 anos e meio, também trazida por minha filha, achada na rua em dia de muita chuva: - Posso ficar, posso? Eu tomo conta, dou comida, limpo tudo. Ledo engano. Arrumei um bicho pra conviver comigo, entre minhas pernas, nos degraus da escada, sobre minha cama, dentro dos armários, e por ai vai. Onipresente. Pelo menos é silenciosa e limpa. Impressionante como gato é asséptico e cheiroso. Ao natural.  Deve ser por isso, que quando passa aquela mulherona, passos lentos, malemolente, cabeça erguida, olhar petulante, exalando um perfume leve, delicado, a gente vira e fala pra quem esta do nosso lado: - olha só que gata!!! É a própria! Mas voltando a Mina, ela adora deitar-se no meu colo, ronronando, enquanto leio alguma coisa. Virou habito. Já havia me acostumado com ela e ela comigo, pois gato tem uma particularidade, é ele quem escolhe de quem vai ser dono. Isso mesmo, ao contrario do cachorro, o gato é que se torna seu dono. É ele quem escolhe a hora de brincar, de comer, de te dar atenção. Não adianta você chamar, assobiar, ele só te da aquela olhadinha de lado, como se estivesse perguntando: - O que esse cara quer comigo? – e segue sua vidinha sem dar bola pra mais nada. Quando você menos espera, la vem ele, silenciosamente, se enfia entre suas pernas ronronando como se dissesse: - Vem agora brincar comigo! Ela esta sempre por perto, não sai de casa e no máximo passeia pelo quintal dolentemente. O Johnny não. Desde que chegou, ainda bebê, notei que era diferente. Inquieto, hiperativo, temperamento completamente atípico. Ele dava pulos altíssimos, parecia um sagüi! Passei a prestar mais atenção a ele. Interessante, né? Com filho a gente é também assim, a gente acaba se apegando mais àquele mais ativo, o que da mais trabalho. O Johnny me adotou de cara, virou meu dono. Gosto de andar descalço e ele vive ao meu lado mordiscando meus dedos. Ralho com ele, ele para. Se esta distante, assobio ele vem. Chamo pelo nome, ele vem. Até se eu pedir para trazer pequenos objetos que lhe atiro, ele traz. Parece cachorro. Eu fico achando que é um cachorro em corpo de gato. Alma canina. Com tudo isso, a gente cria um amor pelo bichano. A noite, antes de deitar, confiro se ele esta em casa. Se não estiver, eu o procuro, assobio, chamo, até ele aparecer. De vez em quando ele pulava no quintal do vizinho e de lá o retorno é fácil. Ontem uma funcionaria de uma empresa, que fica a quatro casas acima da minha, na mesma rua ligou: - É daí que tem um gato angorá chamado Johnny? Nossa empregada Maria, espantada, disse que era daqui mesmo e foi correndo buscá-lo. Ele usa uma coleira onde tem um pequeno medalhão com o seu nome e telefone. Ainda bem. Ao voltar, Maria, com a figurinha no colo, disse que la estava a maior festa, todos o rodeavam enquanto ele tomava leite em um pires, presente das mocinhas do escritório. Era o centro das atenções. Fiquei muito preocupado. Ele começava a dar vôos mais longos, cada vez mais distantes. E se ele não souber voltar? Por essas e outras, fiquei angustiado quando o vi pular o muro para a rua. Rua é outra coisa, não é o quintal dos vizinhos. Lá tem automóveis barulhentos, que podem assustá-lo. Não tem mocinhas gentis pra telefonar.  Podem existir sim, pessoas nem sempre corretas que podem judiar do animal ou mesmo roubá-lo por sua beleza e docilidade. Ele é esse bonitão lá de cima. Fui a rua diversas vezes para ver se o encontrava, nada! Na ultima vez que fui, após varias horas, ouço o miado do Johnny. É, a gente reconhece o miado. Olho para cima, lá estava ele nos galhos de uma arvore enorme que tem em nosso passeio. Chamei-o ele se aproximou achando que eu queria brincar. Quando fui pega-lo subiu correndo novamente. Entrei então em casa e me dirigi ao jardim, lá estava ele, todo serelepe, alegrinho e veio correndo em minha direção. A partir de hoje, minhas preocupações com ele terminaram. Ele atingiu a maioridade. Já é um rapazinho. Pode finalmente sair sozinho e se esbaldar. Bonitão, vai ficar cheio de gatinha atrás dele.  A hora que voltar é essa mesmo. Afinal ele tem a chave de casa!

Tive a honra de ter este texto publicado pela 
Seleções Readers Digest confira aqui

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